Concerto de encerramento das Festas de Lisboa - 2008 |
Caso sério, o Jorge. Um criador naturalmente inspirado, que vive e conta o que vive, sempre por influências cruzadas, rock, folk, jazz, canção francesa, Rimbaud, Dylan, os códigos da Beat e de outras literaturas e músicas.
Nestes itens é de certo modo um irmão, embora eu use vários imaginários e ferramentas diferentes. O Palma cedo encontrou a sua forma de dizer, poeticamente por vezes tropeçante, mas com um rasgo e um ímpeto invulgares. Lembro-me de um dia me mostrar o que andava a reaprender, nada menos que a "Patética", de Beethoven (grau de dificuldade: grande), sonata que eu ouvia a minha mãe tocar em garoto e que sempre me estremecia. Falámos disso com prazer no seu último andar de então. E lembro-me, ainda antes, de o ouvir pela primeira vez no LP "'Té Já", de ter pensado "Isto é bom" e de lho ter dito pouco depois. Somos amigos desde aí, e se calhar até antes. 'O Lado Errado da Noite", tema recorrente dos seus dias, é, atipicamente, uma canção em que narra, com nomes próprios, personagens alheios ao seu quotidiano ('Jeremias' é outra exceção). Começa em Santa Apolónia, "quando Amélia desceu da carruagem dura e pegajosa com o coração danificado e a cabeça em polvorosa, na mala o frasco de Bien-Être mal vedado e o caderno dos desabafos todo ensopado", pronta a dirigir-se "ao lado errado da noite". E vai mesmo, repetindo a vida desgraçada e desengraçada da sua pequena cidade. Na parte final, há um saxofonista (metáfora própria?) que encontra a sua inspiração numa notícia de jornal, "acerca de uma mulher que foi levada a tribunal por ter assassinado uma criança recém-nascida, o juiz era um homem que prezava muito a vida, e a pena foi agravada por tudo se ter passado no lado errado da noite". Ou seja, "só por existir", Palma dixit.
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