sexta-feira, abril 27, 2007

Queima das Fitas de Coimbra

Está confirmada a presença de Jorge Palma, passado exactamente um ano, no próximo dia 11 de Maio na Queima das Fitas de Coimbra, na mesma noite de Liquido e Pedro Abrunhosa.

Agradecimento a Estefânia Reis pelo alerta!

quarta-feira, abril 18, 2007

Jorge Palma no Taipas I Feijão?

Eu sei que temos o BAIRRO
DO AMOR pelas manhãs
E o que é FRÁGIL e delicado
Para que a vida nos surja tão bela
Ou A ESCOLA por onde saltámos
De Paris até Alfama ou Sodré

Há que trazer ao colo o beijo delicado
Que de lábio a lábio nos devolve os
PASSOS
EM VOLTA de um copo
Que o Herberto não deixou à toa sobre a mesa
Do tasco ou da invenção da poesia mais elevada...

Se soubesses a verdade, Ó se soubesses:
DEIXA-ME RIR
Ou ter a minha inocência de pensar
Que de Lisboa até ao fim da RAZÃO DE ESTADO
Algumas das nossas incoerências sejam providências
e razão para existir!

Sei na PALMA da mão que este meu sentir
E, também, talvez o teu, seja O LADO ERRADO DA NOITE,
Mas não vou desistir
Nem zarpar da vida para não sentir
Que na aurora há um inocente
E atrasado que diz, bem humorado:
DEIXA-ME RIR!


António Teixeira e Castro
Porto, Abril de 2007


António Teixeira e Castro, poeta, companheiro de várias andanças de Jorge Palma e anfitrião da acolhedora casa de pasto e de cultura, Taipas I Feijão na Rua das Taipas, Porto.

segunda-feira, abril 09, 2007

Longe demais

Encostei o carro num recanto solitário da estrada estreita de terra batida e deixei o tempo afastar-se devagar até perder o sentido, imergindo naquele profundo silêncio verde e castanho que estava mesmo a pedir um comprido cigarro, como o Carnaval do Rio exige uns bons tragos de cachaça. Naquela manhã sentia-me particularmente desmotivado e passou-me pela cabeça voltar para casa, ouvir Bach e adormecer de novo. Pensei melhor. Achei que isso acabar por me fazer senti uma espécie de derrota, seria desistir de viver por inteiro aquele belo dia de Primavera com os sentidos bem despertos, significaria virar as costas à serra, à “minha” serra, renunciar ao desafio de enfrentá-la uma vez mais de alma aberta, faltar ao nosso habitual duelo fraterno e profundo. Decidi ficar. Há algum tempo que me deslocava regularmente para aquela zona, de cavalete, tela e tralha e tal, com o propósito de captar em pinceladas os segredos daquela magnífica quietude, procurando sempre descobrir ângulos e perspectivas diferentes, queria fazer de Sintra a minha Montanha de Sainte-Victoire e que ela, em troca, tivesse a generosidade de revelar em mim o génio de um Cézanne. Em suma, estava desesperadamente decidido a ser artista, só muito mais tarde tive consciência de quão ambicioso, gratificante e natural é, pura e simplesmente, deixarmo-nos “ser”. A verdade é que eu tinha acabado de passar por um período de auto-comiseração, de solidão involuntária e depressiva, e procurava a todo o custo preencher o enorme vazio provocado pelo desmoronar de uma relação, daquelas que se julgara indestrutível, imune ao próprio desgaste do tempo – “esse grande escultor” – pelo delirante e generalizado facto de ambos os protagonistas terem insistente e prolongadamente acreditado terem sido feitos um para o outro, contra todos os sinais visíveia, aliás. Como se a Natureza oferecesse a alguém, de mão beijada, a sua alma gémea e complementar, poupando-nos assim à enorme trabalheira de termos de nos ir “fazendo” uns aos outros, instante a instante, decifrando e moldando em função de tudo o que vai acontecendo dentro e fora de nós. É realmente mais fácil e reconfortante pensarmos que paixões, alianças e cumplicidades nascidas de situações ímpares, instantes únicos arquitectados sabe-se lá porque raio de conjunturas que nos transcendem, estão ali para durar para sempre. É fácil mas é incómodo, exasperante, quando somos mesmo obrigados a reconhecer que a vontade não chega para que as coisas sejam como desejaríamos, quando não conseguimos mais mentir desalmadamente aos espelhos, quando temos que nos lembrar de novo que o amor eterno existe, mas noutra dimensão, onde nada pertence a ninguém.

À medida que a minha mente ia tecendo considerações desta natureza, as cores espalhavam-se calmamente pela tela, experimentando novas tonalidades, novas formas, novas convivências, deixando o sol determinar firmemente o seu destino, e foi já perto do lusco-fusco, quando eu estava a dar a minha obra por concluída, que vi surgirem na linha curvilínea do horizonte, desenhada por uma pequena colina com várias árvores dispersas, 5 figuras humanas, que me pareceu serem a de uma rapariga e quatro rapazes. A distância não me permitia ouvi-los nem ver as suas expressões, apenas as suas silhuetas em movimento, os seus gestos, as suas piruetas, podia jurar que se riam com prazer genuíno, despreocupada e efusivamente. De alguma forma e apesar da velocidade dos seus movimentos, consegui integrá-los na minha pintura e transmitir através dessa representação, com a ajuda dum súbito bafo divino de inspiração, a sua alegria transbordante. Lembro-me de ter voado nos meus sonhos nessa noite. O quadro desapareceu, anos depois, duma casa onde vivi algum tempo, ali para o Príncipe Real, alguém o levou sem pedir licença, numa daquelas noites brancas em que as pessoas vão chegando e dizem “olá”, ficam por tempo indefinido e, quando lhes apetece, vão-se embora sem ninguém dar por isso, sem dizerem “té amanhã” – talvez por amanhã ser sempre longe demais – naquelas noites que se recusam a ter um fim preciso. Ocasionalmente, em certos concertos, encontros, momentos especiais, tornou-se natural essa pintura invadir-me a memória com todos os seus detallhes, do mais pequeno arbusto ao enquadramento da serra e do céu, com aqueles vultos mágicos a disparar vida em todas as direcções. Fiquei paralisado de espanto, quando há poucos meses, ao olhar distraidamente para a montra dum alfarrabista parisiense, dei de caras com a minha pintura, era exactamente a mesma pintura, só que em tamanho mais reduzido –servia de ilustração para a capa dum livro já muito usado, provavelmente antigo, onde o título da obra e o nome do autor constavam, em negro baço, num alfabeto que me pareceu ser cirílico. Escusado será dizer que não me dei ao trabalho de entrar para obter informações sobre a obra. Senti apenas uma calma profunda a instalar-se em mim e o vidro da montra reflectiu o meu sorriso, longo e bonito, quase irreconhecível.

-Jorge Palma-




"Amanhã É Sempre Longe de Mais

Pela janela mal fechada
Entra já a luz do dia
Morre a sombra desejada
Numa esperança fugidia
Foi uma noite sem sono
Entre saliva e suor
Com um travo de abandono
E gosto a outro sabor


Dizes-me até amanhã
Que tem de ser que te vais
Porque amanhã sabes bem
É sempre longe demais
Acendo mais um cigarro
Invento mil ideais
Só que amanhã sei-o bem
É sempre longe demais


Pela janela mal fechada
Chega a hora do cansaço
Vai-se o tempo desfiando
Em anéis de fumo baço
"

Vitinha

(Rádio Macau)

sábado, abril 07, 2007

Sugestão de leitura




A origem do "Voo Nocturno"de Jorge Palma:
"Voo Nocturno" de Saint-Exupéry


O romance Voo Nocturno é uma descrição da trágica aventura de um dos pioneiros da aviação. A história passa-se numa época em que o serviço nocturno era ainda bastante problemático, pois, às surpresas de uma rota aérea, eram somadas as dificuldades inerentes à realização de um voo pela noite que dependia sobretudo da ousadia e da perícia do piloto.
Voar era para Saint-Exupéry uma reflexão sobre a solidão, a amizade, o verdadeiro significado da vida, a condição humana e a liberdade.
Jorge Palma, in "Voo Nocturno": "...neste voo nocturno sou mais leve do que o ar..."
Tiago Branco

quarta-feira, abril 04, 2007

Pré-apresentação do Voo Nocturno

Encosta-te a mim
Encosta-te a mim, nós já vivemos cem mil anos
encosta-te a mim, talvez eu esteja a exagerar
encosta-te a mim, dá cabo dos teus desenganos
não queiras ver quem eu não sou, deixa-me chegar.

Chegado da guerra, fiz tudo p´ra sobreviver
em nome da terra, no fundo p´ra te merecer
recebe-me bem, não desencantes os meus passos
faz de mim o teu herói, não quero adormecer.

Tudo o que eu vi, estou a partilhar contigo
o que não vivi, hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim.

Encosta-te a mim, desatinamos tantas vezes
vizinha de mim, deixa ser meu o teu quintal
recebe esta pomba que não está armadilhada
foi comprada, foi roubada, seja como for.

Eu venho do nada porque arrasei o que não quis
em nome da estrada onde só quero ser feliz
enrosca-te a mim, vai desarmar a flor queimada
vai beijar o homem-bomba, quero adormecer.

Tudo o que eu vi, estou a partilhar contigo
o que não vivi, um dia hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim.


Jorge Palma, in Voo Nocturno
(edição prevista- Abril de 2007)
Tiago Branco